quarta-feira, fevereiro 28, 2018

CASA DA VIAGEM

Volta da praia.
O dia havia sido lindo em família.
Tão bom que resolvemos esticá-lo:
a noite já era nossa irmã.
Nada melhor do que estar com quem se ama.
Lugar de paz e de harmonia
é o lugar da família.
Ali a gente ouve os cantos do coração,
ali a gente encontra as respostas da alma,
ali a gente ouve histórias recontadas
e requentadas no forno da emoção.

Família é lugar bom de se estar,
mesmo quando trancafiados num carro
dentro de um engarrafamento enorme...
E era o que estava acontecendo.
Quem poderia imaginar que após dia tão intenso
haveria tais emoções para enfrentar?
Mas, nada que uma brincadeira de “adedanha” não resolvesse.
E lá fomos nós revisitar os verbos no infinitivo
seguindo a letra do alfabeto sorteada...

Brincamos à exaustão!
Até que, ao passar por um atalho de ruas de bairro
(para fugir do engarramento monstro de rodovia)
nos deparamos com um carnaval mixuruca
na pracinha daquele bairro.
Uma música da caixa de som de segunda,
uns poucos dançantes já sem ânimo
e umas duas dezenas de foliões com copos
de cerveja nas mãos, entornando suas esperanças...

A brincadeira de “adedanha” parou.
Um locutor de ocasião, tomou o microfone
e após algumas tentativas para acabar
com a chiadeira do paciente, anunciou:
Ô mãe do Felipe, onde você está?
Seu filho está aqui perdido,
precisando de você...
Nada.
O locutor anunciou de novo e resolveu
incrementar o anúncio:
  Ele deve ter 1, 2 ou 4 anos...
Perceba-se que o álcool já havia
comprometido sua capacidade de avaliação,
mas não seu senso moral. Emendou:
Gente, vamos ter cuidado com nossas crianças.
Ô mãe do Felipe, onde você está?
Resolveu entrevistar o menino:
Felipe, você mora onde?
Na casa da viagem!
Ele não é daqui gente,
o menino não é daqui!
Parace que o entusiasmo de estar
praticando uma boa ação
levou nosso locutor anônimo
à ter uma conclusão lúcida.

E aí a fila de carros seguiu
e lá fomos nós com o incômodo no coração.

Era perto da meia-noite.
Novos barulhos somaram-se ao do microfone sujo
e nossa angústia pelo Felipe se diluiu.
Antes de sairmos da praça
alguém falou respondendo à pergunta do locutor:
Deve estar com algum homem por aí...

Fiquei pensando na resposta do menino
à pegunta: “Onde você mora?”
“– Na casa da viagem!”

A resposta do menino me fez concluir
Que, se a vida é uma viagem,
existe uma casa onde se mora
e outra que é a casa da viagem.
A casa da viagem é uma casa de passagem.
Hoje se está nela, amanhã não mais!
Fica-se um tempo, mas sabe-se que
haverá uma volta, um retorno ao lar.

Do ponto de vista espiritual
nossa casa da viagem é aqui na terra;
não importa qual:
se pequena ou grande;
se simples ou luxuosa;
se descuidada ou limpinha;
se própria ou alugada;
nossa casa daqui – e qualquer casa –
é nossa casa da viagem...

Viemos de Deus e para ele retornaremos.
Qualquer casa aqui da terra
será nossa casa de passagem.
Quem se fixa nestas paragens,
se esquece que tudo aqui é transitório;
só a eternidade é definitiva.
E é aqui nesta casa da viagem
que a gente escolhe Deus.
Precisamos estar preparados
para o retorno à Casa do Pai.

Deus abandonou seu Filho à própria sorte na cruz,
para que o prazer da vitória fosse
dos demais filhos que adotou em Jesus.
Mas ele sofreu junto.
      Eli, Eli, lamá sabactâni!

É egoísmo não lembrar do Filho
ao se optar por dar uma voltinha inconsequente neste mundo.

Lembremos que a viagem um dia acaba
e que todos retornaremos para Casa:
Estás preparado para o Encontro com o Pai?

Josué Ebenézer Rio das Ostras,
15/02/2018 (07h31min).
[Calcada em episódio vivido no fim da noite do dia 13/02/2018].

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