domingo, novembro 11, 2007

Com Promessa

(Dedicada à irmã Letícia em seus 80 anos)

Quando uma criança nasce
enchendo a casa de alegria
pegamos o bebê no colo,
sorrimos, e olhando o frágil ser
não sabemos no que vai dar...

Surge, então, uma grande interrogação
em nossas frontes de pais ansiosos:
E à moda da região montanhosa da Judéia,
perguntamos: - Que virá a ser esta criança?

A criança cresce, se desenvolve,
tomando outros ares e contornos,
trazendo-nos satisfação
e deixando o bebê para trás.
Mas, ainda assim,
a indagação persiste:
- Que virá a ser esta criança?

Nos esforçamos, cuidamos,
amamos e acariciamos.
Fazemos investimentos sem poder!
E a criança explode de saúde,
torna-se um atleta, um pintor,
um artista, um músico, um corredor...
Mesmo que de paredes e portas,
ou de banheiros e quartos,
ou ainda transformando os corredores da casa
em pistas de alta velocidade...

Mas, é o nosso pimpolho
e nós olhamos para o júnior
como nossa herança bendita
- o filho da promessa sagrada -
e sonhamos para ele nada menos
que um herói: o grande
redentor da pátria amada.
Mas nem tudo sai exatamente como planejamos:
uma enfermidade, uma anemia,
um pouco de cansaço e estresse,
vontade de só ficar na casa da tia
e a tarefa de casa desaparece,
e o dever da escola não se faz,
e a higiene pessoal já não compraz.

Olhamos o nosso rebento e,
com apreço, disciplinamos.
É o futuro que está em jogo:
ele, com certeza, precisa logo aprender
as duras regras do bom viver!

Faz-se adolescente!
Seus olhos, agora, são multifacetados.
Vê a família, mas enxerga o mundo;
gosta de brincar, mas começa
também a querer aproximação
daquele ou daquela que
lhe provoca um turbilhão
em seu frágil coração
tomado totalmente pela emoção.

Pensa que pode ganhar o mundo sozinho
ou abraçar a existência de uma só vez.
Foge um pouco da companhia dos pais
e a sua palavra oficial é a liberdade.
Mas ainda não está preparado pra vida
e enquanto vai adicionando experiências
supõe que suprimir por ausências
os pais chatos e sua disciplina
pela presença que faz a menina
dos olhos brilhar de satisfação
é a sua grande sina.

Fala em deixar a igreja,
torna-se surdo para Deus,
atrai-se pela cerveja
e afasta-se dos seus.
E rompe-se a ligadura fraterna
de quem estabeleceu pontes divinas
para aquele que chegou ao lar
como promessa de vida.

Na juventude, o estudo,
o trabalho, a profissão.
Decorrências significativas
da sonhada vocação.
O namoro, o noivado,
casamento em grande festa.
E a alegria visível
está estampada na testa.

No sorriso, nos lábios, no rosto
em cada canto da face
se começa a responder
aquela pergunta antiga
que os pais logo fizeram
quando o viram nascer:
- Que virá a ser esta criança?

Está sendo! Fez escolhas!
O caminho delineado.
Os pais se esforçaram,
cumpriram a sua parte
e o destino está traçado.

O jovem ser se transforma
ganha a sua independência.
Deixa a casa e se faz gente
com a própria consciência.
É hora de se colher os frutos
das sementes que os pais plantaram.
Ou será que da vida, os furtos,
para o jovem nada deixaram?

A vida prossegue célere.
Os pais se tornam avós.
Os filhos se tornam pais.
As crianças que já não eram
voltam a ser tudo de novo
correndo pela casa vazia
quebrando o que já está velho.

E tudo o que antes se fazia
agora já não é bem assim.
Com a vinda da aposentadoria
as coisas já não têm tanta pressa.
Mas o relógio não sabe disso
e engole os dias e consome os anos
com uma sofreguidão tamanha
tal qual nunca imaginamos.

E passamos a contar os nossos dias...
E passamos a contar as nossas horas...
E passamos a enumerar a
nossa enorme descendência...
Era eu só: casei, virei dois;
procriei, virei vários;
amadureci, virei muitos;
envelheci, perdi as contas.
E o vocabulário adicionou
uma doce palavra que pequenos
seres de cabelos claros e
olhos azuis carregam
em seus perambulares pela vida:
bisnetinhos...

E chegamos ao alto da melhor idade:
com saúde ou não,
mas com a mente em bom estado.
Gostando ou não do que vemos,
achando que o mundo está muito mudado,
que bom mesmo eram aqueles tempos:
Hoje a vida está muito superficial!
E a gente nem lembra -
talvez porque não tenha vivido
e se esqueceu de consultar
a memória da humanidade:
Que há mil anos era assim;
há quinhentos, também;
conosco, está sendo;
e o será, no futuro:
Os velhos sempre gostarão do passado,
já que o futuro está ficando
cada vez mais curto para eles...

- Que virá a ser? Não se pergunta mais.
E olha que já tem tempo isso!
Já aconteceu! - O que foi?
Nada do que foi será de novo
porque as experiências são únicas,
não se repetem. - O que foi?
- Que fiz da minha vida?
Será que o ser humano
quer mesmo saber?
Alguns dirão que não vale a pena.
É melhor tocar o barco,
se é que queremos chegar
a um Porto Seguro!

Há alegrias no envelhecer
e as alegrias do envelhecer
se encontram na segurança da presença divina.
A sabedoria da escolha de Deus
garante o futuro na terra,
garante o futuro nos céus.

E quando alguém pode
chegar aos setenta,
aos oitenta, noventa ou cem,
nos lembramos da grande
probabilidade de ser promessa:
- Eis alguém que honrou pai e mãe
e teve os dias na terra prolongado...

Nova Friburgo, 22 de junho de 2001 (7h26m)

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